terça-feira, 20 de outubro de 2009

Marvão - Três copinhos com o Licor da Dona Joaquina



O dia-a-dia de Maria Joaquina Ramiro faz-se de muita paciência. Um saber esperar temperado com experiência, persistência e espírito inventivo que resulta, no final, numa multidão de frasquinhos plenos de doçura.

A mesa que Joaquina montou com todo o esmero na mostra de doçaria que decorreu em Setembro de 2009 em Marvão expõe os seus licores e compotas. Estes servem pretexto para uma conversa que corre todo o caminho que vai da fruta ao produto final. Uma conversa entrecortada por copinhos de prova.

A doceira Joaquina não deixa morrer apenas nas palavras o seu mundo de alquimia que junta frutas, aguardentes e açúcar. Um equilíbrio de ingredientes que esta alentejana do concelho de Marvão testa há mais de 12 anos. «Comecei no restaurante onde trabalho. Fazia a ginja para adoçar a boca aos clientes quando iam almoçar ou jantar».

Um adoçar que agradava. Maria Joaquina chegou a fazer mais de 500 litros de ginja por ano, tudo distribuído em copinhos.

«Nem tenho conta os copinhos que saíram. As pessoas perguntavam se lhes vendia uma garrafinha». A resposta, invariável era um «não», como nos relata a doceira. Ficava, no entanto, uma vontade de agradar, de entregar a mais destinatários o resultado de muitas horas com o olho fixo na panela em busca do ponto perfeito para o xarope; de meses de atenção sobre a maceração da fruta em aguardente; a alegria do produto final.

«Percebi que as câmaras municipais nestas coisas, em pequenas dimensões, autorizam o fabrico. Nem pensei duas vezes. Candidatei-me e agora trago os meus licores às feiras».

Joaquina fala, sobrepondo palavras ao burburinho que invade a mostra de doces. Distraidamente enche mais um copinho, um pouco acima da medida que garante uma certa lucidez final.

«Este é de amora. Ora prove». «Excelente», compete dizer, sem exagero no adjectivo.

«Sabe como o arranjei?», pergunta Maria Joaquina: «frente à minha casa há uma amoreira muito antiga. Todos os dias passo por ela. Certa vez reparo com outros olhos. Fico a mirar aquelas amoras maduras quase a cair. Apanhei-as e saiu esse licor. Já reparou na cor? Limpinha». Joaquina não guarda segredo. «A única coisa que ainda não faço é o vidro da garrafa».

A doceira sorri sobre as palavras que acaba de lançar. A receita para os licores de Joaquina faz-se da experiência, testando combinações, conversando com outras doceiras, adaptando à sua maneira de confeccionar. O resultado desdobra-se em licores de ginja, café, amora, café com canela, alperce. Com este fruto, diz-nos Maria Joaquina, «fiz um doce. Depois, sequei as cascas e os caroços e pus a macerar. O resultado final é esta cor bonita». Enche-se mais um copinho, um bojo de líquido de cor leve.
Palavra - chave: alentejo

Sem comentários:

Enviar um comentário